Sombras e Espelhos: A Valsa da Transferência
Rafael Marques Menezes,
Psicanalista e Diretor da Escola Britânica de Psicanálise
No espaço silencioso do meu consultório, onde segredos e sombras se entrelaçam, desenrola-se a valsa da transferência. Aqui, cada paciente traz consigo um baú de memórias, abrindo-o diante de mim, o analista, numa dança delicada de sombras e espelhos.
Neste palco de introspecção, sou inadvertidamente transformado em figuras do passado – ecos de pais, irmãos, autoridades que marcaram a alma do paciente. Como um ator em um drama psíquico, assumo papéis variados, refletindo a tríade edípica que se entrelaça nas narrativas de amor, conflito e dependência.
Às vezes, torno-me uma sombra persecutória, uma entidade crítica ou punitiva, ecoando um passado onde a autoridade se vestia de medo e julgamento. Nesses momentos, a sala de análise se torna um palco de ansiedades ancestrais, um teatro onde antigos medos são revividos e confrontados. Em outros atos, sou elevado ao pedestal da idealização, transformado em um farol de perfeição e infalibilidade. Essa idealização, embora lisonjeira, é um espelho da busca incessante do paciente por segurança e amor incondicional.
Mas a verdadeira dança começa quando o paciente me vê como um objeto real – uma pessoa separada, com suas próprias nuances e falhas. Esse reconhecimento é um passo de valsa rumo à maturidade emocional, um movimento gracioso em direção à independência psíquica.
Na valsa da posição psíquica, a posição esquizo-paranoide traz consigo uma dança de cisão e projeção. Neste ato, o mundo se divide em preto e branco, e eu, como analista, sou alternado entre esses extremos. Essa posição é uma luta contra ansiedades primitivas, um medo de perseguição que ecoa nas paredes da mente.
Quando a música muda para a posição depressiva, a dança se torna mais introspectiva. Surge uma preocupação com o impacto das próprias ações sobre mim, o analista. O paciente começa a dançar com empatia, movendo-se com a crescente capacidade de ver o mundo além do próprio self.
Esta valsa transferencial é um reflexo do desenvolvimento emocional do paciente. Cada sessão é um passo na dança da compreensão e integração, onde os ecos do passado são reconhecidos e transformados. Como analista, sou um espelho e um acompanhante nesta dança, testemunhando a incrível jornada do ser humano em direção ao crescimento e amadurecimento psíquico e emocional.
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